A brasilidade volta a pulsar
Nos últimos dias, me deparei com o novo relatório Tá Quente Brasil 2025, da FutureBrand. E, enquanto lia, uma pergunta não saía da minha cabeça: por que, mesmo diante de tantos desafios socioeconômicos, o Brasil continua encontrando novas formas de se apaixonar por si mesmo?
O estudo mostra que, apesar das crises, tensões e contradições, existe uma força identitária emergindo, uma vontade coletiva de reafirmar o que é ser brasileiro. E não é só “orgulho nacional” superficial, é um movimento cultural, criativo e afetivo. O Brasil voltou à moda, literalmente e simbolicamente. E isso transcende futebol e carnaval, nossos eternos clichês e assinaturas para o mundo.
Basta lembrar tudo o que aconteceu recentemente com a corrida do filme Ainda estou aqui ao Oscar e a mobilização nacional em torno da Fernanda Torres. A comoção, os memes, as torcidas espontâneas, até o hate nos oponentes. Tudo isso mostrou um Brasil que se reconhece na sua arte, nas suas narrativas, nos seus rostos. Um Brasil que quer se ver e ser visto no mundo.
Outro ponto levantado pelo estudo é emblemático: o brasileiro é, antes de tudo, engajado. Nem sempre cordial, mas profundamente participativo. O País descobriu que tem nas mãos um poder coletivo online capaz de movimentar conversas em ritmo acelerado. A polarização nas redes faz aflorar conflitos culturais, políticos e cotidianos, mas também cria ondas de mobilização únicas.
Para as marcas, isso não é um detalhe, é um sinal claríssimo de que o Brasil é um dos mercados mais conversacionais do mundo, onde comunicar ultrapassa o informar: é provocar, ouvir, dialogar, participar.
Comunidades: oportunidade estratégica
Outro dado que me chamou atenção no relatório foi que, segundo a Agência Brasil, o número de brasileiros que moram sozinhos cresceu 52% em 12 anos, chegando a 18% da população. E, paradoxalmente, quanto mais as pessoas vivem sozinhas, maior a busca por vínculos afetivos, amizades significativas e espaços de reconexão, seja no online ou no físico.
Isso se traduz em comportamentos: mais grupos, mais encontros, mais coletividade. Mais “nós”.
E para o branding, esse é um território fértil: marcas que criam comunidade sabem que as pessoas querem pertencer. E o Brasil, país historicamente relacional, responde a isso de forma muito mais intensa que outros mercados.
Um país que se ancora no simbólico
O estudo também aponta a força da espiritualidade como parte da identidade brasileira contemporânea. Não à toa, 18 milhões de viagens no País são motivadas pela fé, movimentando cerca de R$15 bilhões por ano. O sucesso de movimentos como o Legendários, o boom de igrejas neopentecostais, o crescimento de conteúdos como “Café com Deus Pai”, tudo isso revela algo importante: o Brasil contemporâneo quer, ao mesmo tempo, reforçar tradições e questioná-las. Um paradoxo muito nosso. Uma busca por conexão, significado e pertencimento.
E o que tudo isso significa para o marketing e o branding?
Uma das principais reflexões que tiro desse relatório é algo óbvio que às vezes é esquecido: o Brasil não precisa copiar o que funciona lá fora. Claro, tendências globais importam e sempre vamos acompanhar, mas somos um país continental, criativo, híbrido, contraditório e profundamente expressivo.
Criamos nossas próprias referências, símbolos, narrativas e, principalmente, criamos nossas próprias conversas. Somos o país do meme, da mobilização coletiva, da festa e da fé, do afeto e da polêmica.
E para quem cria branding e posicionamento, como nós na Le Pera, isso traz um lembrete valioso: no Brasil, marcas relevantes e desejadas não falam para as pessoas, falam com as pessoas.
Escrito por:Stefania Ricciulli, Head de Branding na Le Pera


